sexta-feira, 20 de julho de 2012

Chega-te a mim e deixa-te estar



Pois bem, Eu, Ana Bárbara a ler um livro.
Para muitos a coisa mais normal do mundo, para mim um orgulho. 

Um dia destes acordei, sei lá como, talvez com os pés fora da cama ou coisa do género, e decidi que ia investir na leitura. Primeiro (confesso) para me ocupar o tempo nas horas que gosto de passar  na esplanada. Depois, porque pensei que umas palavras sábias (ou não) pudessem contribuir para a minha pessoa, tanto mais não seja para enriquecer o meu vocabulário com as palavras caras que por vezes se fazem ler. Ou ainda que possam contribuir para a ascensão da minha sabedoria para a profissão. Depois de várias horas e alguns dias na indecisão do que comprar, lembrei-me do quanto uma amiga minha gosta de Eduardo Sá, e não pensei muito mais (se não a dúvida permanecia: e se for este? e este? ou aquele?...).
Eduardo Sá nasceu em Leiria, em 1962. Psicólogo, psicanalista e professor de Psicologia clínica no Instituto Superior de Psicologia Aplicada em Lisboa e na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, onde se formou. 

Aqui fica a introdução para quem tenha curiosidade. Se estou a gostar? Sim.

“Eu sei que nem todos os dias são manhãs de sol. E que neste equilíbrio, ora enamorado ora saturno, com a Natureza, também dentro de nós a vida ou se enche de brios, ou como um bocejo que se prolonga, fica pachorrenta e até incomoda.
Sei também que pode parecer ingratidão dizê-lo assim… mas talvez o que nos empanturre seja o lixo dos sentimentos. Tudo aquilo que fica (e, para mais, hermeticamente guardado) das relações de conveniência, do narcisismo dos outros que nos atropela, e do mau «humor corporal» daqueles que, em todos os gestos, têm no olhar uma espécie de grafitti do género: «cuidado com o cão!». Mais as poses «a puxar ao sério» daqueles que, à falta de melhor, de cada reunião – que tornam estéril e interminável – fazem um exercício de poder.
Do lixo dos sentimentos sobre a nossa fala sobre o tempo. Que à falta de coragem de mandarmos para onde «só Deus sabe» quem se chega a nós sem nos merecer, nos leva a falar das nuvens do céu, poupando esses passageiros acidentais do nosso coração a tempestuosos aguaceiros e aos nossos mais requintados ciclones.
O lixo dos sentimentos é uma espécie de pelicula peganhenta de indiferença que entra pela «porta dos fundos» da nossa vida e nos guarda, para viver, um quartinho nas traseiras do nosso coração. Será aquilo que nos corrói de «tanto faz», de «vai-se andando», ou de «amanhã será melhor», com que a esperança, o amor de alguém, ou os sonhos (os nossos e aqueles que nos deram para que compartilhássemos) esperam por dias melhores.
Claro que há sempre quem diga que dormir sobre os assuntos é uma fantástica incineradora do lixo dos sentimentos. E quem garanta que, dessa forma, se poupam os resíduos tóxicos e até as dioxinas.
Eu, por mim (recordando aquele simpático chimpanzé de um spot sobre lixos, que não precisava da vida toda para pôr uma casca de banana no sítio certo), defendo que, em vez de guardar-mos (só para nós) aquilo que doa, não devemos deixar de depositar, devidamente acondicionado, dentro de quem nos magoa, a autenticidade de tudo o que sentimos (mesmo que pareçam desperdícios). E defendo mais: que assumamos esta irresistível tendência de separar-mos (dentro de nós) o lixo dos sentimentos, levando a que a sua reciclagem nos permita transformar tudo o que nos mói em sinais interiores de riqueza. Sim: sinais interiores de riqueza. Seja em alegria ou em assombro, em resmunguice, ou na irresistível tentação de gostar dos outros. Desde que tudo o que era para se deitar para o lixe se fale: com um som, com um nome, num gesto ou por um sinal (mesmo que seja simples ou fugaz). Mas que se fale. Porque, afinal, o lixo dos sentimentos embrulha-se de um silêncio que atordoa. E mata, em combustão lenta, todos os namoros com a vida.” Eduardo Sá





1 comentário:

  1. Bárbara, aqui fica mais um gosto em comum :)http://butterfliesehurricanes.blogspot.pt/2012/01/nao-sofro-de-sindrome-de-peter-pan-mas.html

    Esta é a magia da blogosfera!
    Beijinhos Psis

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